A dor no peito era tão forte que distorcia sua imagem no espelho.
- Venha, querida.
Ela olhou, magoada, para a porta; fechou os olhos com força e só depois voltou para encarar o cômodo em que se encontrava.
Havia algumas cadeiras e mesinhas de cor escura mais ao fundo; tudo tinha sido arrastado às pressas para dar lugar aos pertences da noiva. As grandes caixas – onde antes estivera o lindo vestido perolado – agora estavam vazias. Ninguém se dera ao trabalho de arrumar a bagunça. Pedaços de linha, retalhos, alfinetes no chão. As mulheres saíram correndo rindo alto, lançando um último olhar curioso à jovem noiva, e foram para a igreja esperar.
- Venha, querida.
Esperar.
Esperar porque as noivas sempre se atrasam. E a noiva estivera sozinha num cômodo nos fundos da igreja, na tentativa de não esperar demais...
- Venha, querida.
O espelho era grande, dava para ver o corpo inteiro refletido. E ela agora via com amor os detalhes mínimos daquele vestido tão querido. Como se cada pérola, brocado e lantejoula fosse na verdade um pedaço daqueles que esperavam lá fora.
(Esperar demais?)
- Venha, querida.
A voz agora estava mais firme. Mas não demais. A noiva deixou os olhos se encherem de lágrimas. Torceu as mãos com força, mas no fim não conseguiu suprimir mais o soluço. A mãe tinha dito para não chorar, para não borrar a maquiagem. “Deixe para chorar no altar, querida – ela dissera – segure bem, porque toda noiva fica emocionada mesmo”. Tentou engolir o choro com força, mas não conseguiu. Era grande demais.
- Venha, querida.
Pensou no noivo que já devia estar à sua espera no altar. No altar que tinha fitas brancas, como ela escolhera. O noivo não merecia que ela fosse daquela maneira. Não, não merecia.
O reflexo no espelho era uma imagem linda. A noiva no centro, com seu vestido imaculado, o buquê na mesinha logo atrás, a tiara relusindo...
- Venha, querida.
Ela soluçou alto mais uma vez, agora pensando no pai. Com quem ele entraria na igreja? Não, ele também não merecia aquilo. Não merecia.
- Venha, querida.
Era um sonho que ficava no espelho. Um instante congelado do que poderia ter sido. Respirou fundo. Não queria chorar numa hora daquelas.
- Venha, querida.
“Eu te amo”. Foi o último pensamento e o enviou ao noivo do altar de fitas brancas.
- Venha, querida.
Ela foi.
A morte, afinal, era doce e mansa, como embalo de berço.
6 comentários:
Que lindo texto... prabéns!
Guriaaa, que legais seus textos e que interessante teu blog!!!Pra virar um "blog de cabeceira"..risos.Eu já te linkei!!! Bjão. =)
Vou seguir visitando teu blog,pq amei de paixão...mas, como vou restringir o acesso ao meu blog, peço que, caso queira me visitar, mande seu email por meu email,que eu envio o convite! Bjinhos e até. :o)
email: emanuellemed@gmail.com
Meu blog está "aberto ao úblico" outra vez, mas, se gostar dele, sugiro que guarde o convite, pois penso em restringir, assim q tds os convidados tiverem lido o email!Bjs e obrigada. ;o)
Melissa, shame on me. Eu vi que você tinha publicado esse conto há séculos e só agora vim ler com calma, pra comentar.
Teoria II tá te fazendo um bem danado! Embora eu tenha medo, comparando as nossas escritas pré-FALE com as de agora!Bom demais. Confeeesso: não saquei tão bem o drama. Qual o problema com a noiva? Você reinventou a noiva cadáver? uhuu!
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