terça-feira, 23 de outubro de 2007

Um sentimento #2



Can´t you see I´m crying
I don´t even like it



- Is this it? - The Strokes

segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Com quantos lencinhos se faz um personagem querido

*Aviso: Essa coluna contém pequenos spoilers sobre o destino de algumas personagens de séries como Lost, Harry Potter, Senhor dos Anéis, Piratas do Caribe, Star Wars... Então fique avisado!*


O GRANDE ESPOILER DO TEXTO! (Lost)
Motivo: Comecei esse post depois de assistir à morte de Charlie Pace (personagem de Dominic Monaghan) no episódio Throught the looking glass part 2 do seriado Lost.


Eu chorei com a morte de Charlie três vezes e devo ter me desesperado pela iminência dela umas outras três enquanto assistia o seriado Lost. Mas é só um personagem, que bobeira!, muita gente pode dizer, mas ele era o meu favorito. Daqueles personagens que marcam a gente. E eu adoro personagens assim!

Percebi que Charlie Pace era o meu favorito em Lost quando ele é encontrado "morto" dependurado pelo pescoço numa árvore num episódio da primeira temporada da série. Eu e minha irmã - que assiste a série comigo - choramos desesperadamente até Jack ressucitá-lo com uma pancada no peito em meio a uma cena desesperada. O motivo da "morte" de Charlie era o resgate de uma moça grávida pela qual ele se apaixonara. Passional, ao encontrar o sequestrador dispara uma sequência de tiros no peito dele, sem se importar com as informações que o raptor poderia fornecer ao grupo. Mostra de crueldade... ou de humanidade?

Sempre achei a caracterização de Charlie bem humana (Aliás, humanidade é um crédito que dou aos personagens criados pelos roteiristas fodas de Lost), mas daquele tipo de humanidade que faz com que nos identifiquemos com ele, com seus problemas e desejos. Charlie era o cara bacana, gentil, que valorizava a família e a religião (difícil tirar da cabeç a cena de sua morte, onde ele utiliza as últimas forças para fazer o sinal da cruz). Era sensível, um artista talentoso apesar de ter desperdiçado criatividade na banda medíocre que montou com seu irmão Liam. Liam, aliás, é protagonista dos piores pesadelos e assombrações de Charlie, na maioria das vezes acompanhando um punhado de heroína.

Enquanto o vôo 815 da Oceanic caía na misteriosa ilha, Charlie usava heroína no banheiro do avião. A relação da personagem com vício das drogas é explorada na primeira e na segunda temporada. Descobrimos que Charlie é levado à heroína por influência de seu irmão. Auto-confiança nunca foi lá a maior característica da personagem, e numa crise de frustração, Charlie toma sua primeira dose. Suas crises de consciência são realmente interessantes, assim como as escolhas que ele toma para se livrar - ou não - da heroína. Esse conflito entre o cara de bom coração, as drogas e o irmão influenciável me faz lembrar horrores de uma outra série muito querida por mim, que tem um personagem no esquema. É Eddie Dean, de A Torre Negra.

Eddie também é viciado em heroína e também foi influenciado pelo irmão mais velho sem noção (um rapaz simpático chamado Henry). No universo criado por Stephen King, Eddie é escolhido para ser um dos membros da companhia de Roland de Gilead, o último pistoleiro. Arrastado para o Mundo Médio (uma espécie de universo paralelo ao nosso), Eddie sofre para se adaptar e principalmente, para aprender a viver sem heroína. Os dois têm realmente muito em comum: são inseguros, passionais, carismático e têm sempre uma piada na ponta da língua - referência à cultura pop são com eles mesmo. Até mesmo o processo para se livrarem das drogas é bem semelhante: Charlie consegue isso com a ajuda de Locke e de uma imensa força interna que ele mesmo não sabia existir; Eddie, perdido numa praia perigosa num mundo estranho ao lado de um pistoleiro moribundo, é obrigado a lutar para sobreviver e encontra motivo na pessoa de Susannah, a mulher de múltiplas personalidades que se torna sua esposa. O amor, em ambos, é motivo para mudança: Charlie se apaixona por Claire (a moça que fora raptada), chegando até mesmo a amar o filho dela como se fosse seu; o amor de Eddie por Susannah é a força que faz com que ela consiga uma certa instabilidade e se torne uma pessoa una. Charlie e Eddie são pessoas essencialmente boas, eles nunca planejaram algo ruim; se se envolveram com crime, drogas ou violência, foi por má sorte e falta de confiança. Esse lado é mostrado de forma muito forte nas duas séries: para Charlie, no episódio Greatest Hits e para Eddie, no volume Terras Devastadas.


Por que fazer essa "literatura comparada" agora? Porque percebi como os personagens que mais amo, que me fazem rir e chorar, que me fazem torcer, pular, gritar, xingar e vibrar possuem traços em comuns. Alguns é claro, não são tão parecidos quanto Charlie Pace e Eddie Dean, mas eles dividem algumas características primordiais de encantamento, não é a toa que muita gente se identifique com eles....


Temos por exemplo Luke Skywalker, o grande herói dos episódios IV, V e VI de Star Wars. Luke não era nenhum viciado, é claro, mas tinha grande insegurança, apesar do desejo latente de fazer algo bom para o mundo. Insegurança essa que pode ser encontrada em Ron Weasley, o melhor amigo de Harry Potter, que sempre se sentiu inferior e arrastado pelas circunstâncias. Como esquecer de Sam Gamgi, o eterno companheiro de Frodo em sua jornada com o Anel? Ou do Dwayne, em Pequena Miss Sunshine? Vale lembrar também do pirata trapaceiro Jack Sparrow, que se torna herói após se sacrificar em nome dos amigos - e em nome de seu próprio nome, é claro - em Piratas do Caribe - O Baú da Morte. Sacrifício aliás, que faz Luke Skywalker em O Retorno de Jedi, que faz Charlie Pace em Throught the looking glass.

Personagens assim encantam o público. Ganham a platéia pelo coração no primeiro momento. Seja belo bom coração, pelos problemas comuns, pelos sacrifícios que fazem. É com esses personagens que estamos durante a trama. E algumas pessoas levam de uma forma bem pessoal. Eu, por exemplo. Eu me apego. Me apego mesmo. É impossível não chorar com Rudy Steiner no final de A menina que roubava livros, é impossível! Te arranca as tripas, você sente que podia ser você, seu amigo, seu namorado. Podia ser qualquer um! Essa é a grande chave de personagens assim. Sua singularidade reside no fato de que poderiam ser qualquer pessoa.


Eu tenho minha própria teoria de narrativa, e ela diz que uma história que não possui personagens assim, uma trama que não tem personagens queridos para quem se possa tirar os lenços do bolso, não é uma história completa. Faltará sempre um pedaço. Um elo identificador. O tema da frustração, do sacrifício, da lealdade mostrados da forma mais real, não como algo além da imaginação. A hunidade que não é cruel, que não é dura, que não é boa, que é simplesmente humanidade. Que dá alguma esperança. Você chora no fim do filme, seja ele feliz ou triste, e diz "Putz, fulano é que era o herói".

O Charlie Pace é que era o herói no fim das contas, aceitou a morte e foi. Foi sem medo. Para salvar aquelas que amava. E eu não tenho nenhum motivo para esconder que eu me comovi (leia-se me acabei de tanto chorar). Muita gente diz que esse tipo de personagem é típico de escritor/diretor que gosta de comoção barata, de choro e de vela; se for, problemas, porque é simplesmente o máximo! Quem é que não gosta de finais triunfantes e gloriosos? Quem não cai de amores por personagens assim?





Só quem não tem coração mesmo.






*Post dedicado a todos aqueles que amam personagens que nos fazem levar pelo menos uma caixa de lencinho de papel no bolso quando vê um filme, lê um livro ou vibra com uma série de TV. Em especial, para as outras viúvas do baixista.