sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

Senhoras e senhores... os Strokes!

Qualquer pessoa que passe os olhos por este blog vai notar os Strokes pulando aqui e ali. Nos fragmentos "um sentimento", nas indicações de música, em pequenos trechos de contos rápidos. Strokes parou agora no meu hall da bandas favoritas. E acho que convém explicar porquê. (portanto destorça esse nariz e me acompanhe)

História rápida
O Strokes pensou em nascer quando Julian Casablancas (vocalista), Nick Valensi e Fabrizio Moretti se conheceram num colégio em Manhattam. Os três ainda eram conhecidos de um outro cara que estudava numa escola francesa, Nikolai Fraiture (baixista). Os quatro fizeram o que quaisquer adolescentes metidos a rebelde fariam com um mínimo de talento: começaram a tocar juntos. Mas a alegria durou pouco, Julian Casablancas foi mandado para um colégio interno na Suíça por conta de problemas com bebida e péssimas notas. Por lá, ele conheceu Albert Hammond Jr (guitarrista).

(Já deu para perceber que os guris eram podres de ricos, não? - tirando Fraiture, que era pobre e Valensi que era um classe média - Caso você ainda não tenha percebido, Julian é filho do dono da famosa agência de moda Casablancas. Sim sim, ele é filho do John Casablancas, o ultrabilionário dono de hotéis, ações e até um pedaço da Coca-cola. É, eu sei bem que carinha de nojo é essa que você está fazendo. Sei porque eu fiz essa mesma cara quando escutei Last Nite pela primeira vez a uns três anos atrás. E eu sei que as expressões "riquinhos babacas", "banda comprada", "sucesso injusto", "fucking bastard children" e "filhinhos de papai metidos a hype" estão passando pela sua cabeça nessa exato momento, mas calma! Alto lá! Não é você mesmo que diz lutar contra o preconceito? Pois então, continua lendo a historinha, segura a língua mais um pouquinho.)

Quando Hammond Jr. volta para Nova York a fim de cursar faculdade de artes, Julian Casablancas decide dividir um apartamento com ele. Nessa, os velhos amigos de escola Nick, Fab e Nikolai aparecem para uma festinha aqui, uma saidinha ali, e pronto!, temos The Strokes tocando juntos como banda pela primeira vez em 1998.

Depois de fazer todo o marketing básico de uma banda envolvendo EPs, demos, shows com público suspeito e turnês de segunda categoria, os Strokes chegam às paradas de sucesso em 2001 quando lançam seu primeiro album de estúdio, Is this it?.

(Mais uma vez eu peço calma e economia nos xingamentos. Eu sei que você deve estar pensando "o pai do Julian bancou tudo", "são uns filhos da puta mesmo, se fossem pobres ainda estariam tocando no bar do tio Juca...", mas alto lá! Os caras tocam de verdade. A banda é feita pelos cinco mesmo, sem músicos de apoio. As músicas são 100% deles (com destaque no número de composições para Hammond Jr. e Valensi) e as letras são compostas, em sua maioria, pelo punho do próprio Casablancas. Eles podem ser ricos, mas botaram a mão na massa).

Depois disso é festa. Quem é que nunca ouviu The Modern Age, Someday, Hard to Explain? Ah, mas pelo menos Last Nite você já ouviu.... Toda bandinha fundo de quintal que se diz de rock sabe tocar Last Nite. Não tá lembrado "Last nite, she said... oh baby I feel so down...". Vai por mim. Você ouviu essa música, só não tá lembrando direito...

A banda foi para o topo do mundo, foi considerada a salvação do rock pelas revistas que se dizem especializadas e bla bla bla. Em 2003, eles lançaram Room on Fire, que foi outro grande sucesso com músicas como Reptilia, 12:51 (ah, essa você conhece. É aquela com o solinho no começo que parece de video game) e The end has no end.

Dois anos depois veio First Impressions of Earth. A crítica olhou torto para o novo rumo da banda e alguns fãs mais fanáticos se dizem "traídos" pelo novo som. É que "First Impressions" é realmente diferente. Julian Casablancas deixa o vocal super-rouco-voz-de-bêbado-doidão para cantar um pouco mais limpo (se bem que nem é tanto assim). Hammond Jr e Nick Valensi se deixam pirar um pouquinho mais nas guitarras e as letras assumem um tom mais fantástico, um pouco mais fora do "the room is on fire and she´s fixing her hair". Apesar disso, entretanto, o album foi um dos mais baixados pelo iTunes.

Continua olhando torto para eles? Continua achando que eles não valem de nada? Então tire a prova, baixe uma música do Strokes e depois diga se achou ou não. Pelo menos você vai poder ter bagagem para dizer "achei um lixo". Digo isso porque eu era super olho torto para eles, achava que eles eram uns posers sem noção. Até o lindo dia em que ouvi Heart in a Cage. Eu considero Heart in a Cage um das melhores músicas que já ouvi na vida. Sério mesmo. Ela é vibrante, desesperada e tocante ao mesmo tempo. Maravilhosa, desde o solo de guitarra até a célebre frase lamentada por Julian "Now it´s three in the morning and you´re eating alone".

Meu album favorito é First Impressions of Earth e recomendo as músicas (além das clássicas já mencionadas nesse post) : Soma, Someday, Automatic Stop, Between Love & Hate, Juicebox, On the other side, You only live once e 15 minutes.

O que eu mais gosto nos Strokes é a "piração controlada", o modo como a música vai e volta aparentemente de um jeito sem sentido, mas que no fundo encaixa. Gosto também dos riffs de guitarra que se repetem ao fundo. Das letras. Dos vocais roucos e meio desesperados. O modo como eles fazem rock, os temas, as melodias, meio que transmitem o sentimento de ser jovem no mundo hoje. Os temas "sozinho na multidão", "garoto encontra garota", "uma noite sozinho na ciadade" e "o mundo anda rápido demais" podem ser clichés, mas são realidade e quando alguém os recria de uma forma assim tão intensa, vale a pena parar um pouco para ver - ou ouvir.

Pois é, fica aí a indicação para quem quiser conferir. E sem preconceitos. Afinal, eles são considerados o revival do rock de garagem (se eles realmente tocaram em uma garagem ou não, não importa).

quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

Sobre contar histórias

Dizem que Gabriel García Marquez é o último contador de histórias de verdade. Por mais que eu admire García Marquez, acho o título injusto. Existem excelentes contadores de histórias por aí. Porque contador de histórias não precisa ser regional, usar palavras inventadas, jogar com jargões seletos; contador de histórias precisa saber contar, tirar o fôlego, fazer o leitor passar pelas emoções descritas. O velho truque de Sherezade, é disso que é feito um contador de histórias. García Marquez é um deles, não há dúvida, mas ainda existem muitos outros por aí, escondidos ou não, assumidos ou não.

Ainda usando García Marquez como exemplo, dizem que ele resolveu escrever quando leu a primeira linha de Metamorfose, de Kafka. Eu nunca li Metamorfose - não vou fazer fita fingindo que li -, mas acredito que deve conter algo muito forte para despertar um contador de histórias como García Marquez. Eu acredito nessa coisa de ser desperto, sabe, apesar de eu mesma não me lembrar do que me fez ter vontade de escrever. Sempre gostei dessa coisa de inventar, anotar num caderno um monte de histórias malucas e entediar minha irmã com elas depois. Eu lembro que brincava com as outras meninas da rua e elas brigavam comigo porque eu inventava "sempre uma história diferente, por que não continuar com a da última vez?". As pessoas têm caminhos a escolher na vida e um deles leva ao que você é de verdade, à sua missão. O García Marquez encontrou a dele, que é ser contador de histórias - contador de histórias, o que é diferente de ser apenas um escritor - e a coisa deu tão certo que ele ganhou até o prêmio Nobel.

Algumas histórias precisam ser escritas, outras precisam ser contadas. As histórias contadas têm vida própria, elas ultrapassam o papel. Confuso? É, talvez um pouco, vou tentar colocar as coisas em ordem então... - bem, definitivamente, essas discussões do que é cânone e do que não é fermentam na cabeça da gente, né?.

Antigamente eu pensava que se fosse para escrever uma porcaria de um "romance de banca", era melhor não escrever nada. Hoje já não acho que é bem assim que a coisa funciona. Para contar uma história, não importa se ela é um épico, um romance água-com-açúcar, um poema, uma fanfic, um quadrinho... não importa! O formato, o conteúdo, isso não importa. Não importa também se é material para best-seller, para prêmio Nobel, para blog de internet, para a cabeceira de gurias de 13 anos... não importa! O que importa mesmo é quem conta a história. Tá, eu sei que a maioria dos teóricos rejeita - e possivelmente sofre um ataque cardíaco depois - essa idéia, mas é a verdade. Okay, o leitor também é importante, obviamente, mas o contador de histórias (que pode ser um escritor ou não) é como um balanço que leva a história até as outras pessoas. É a corrente que liga. Um contador de histórias precisa ter um coração sincero. E isso quer dizer que ele não deve se importar se vai ser cânone ou não, se vai soar bonito ou não, o contador de histórias verdadeiro consegue captar o que a história precisa e dar a ela a forma que ela pediu. Isso é saber contar histórias. Não é enquadrar a história no formato X, é deixar a história dizer que formato é. Por isso que um contador de histórias precisa ter um bom ouvido além da habilidade com as palavras...

Stephen King (um contador de histórias da cidade) disse que sabe que suas histórias não são perfeitas e que nenhuma ficção o é (as histórias, assim como os homens, são humanas porque têm de passar por humanos para ter voz. Não é possível que sejam perfeitas pois a perfeição está além da nossa compreensão e percepção das coisas), mas disse que quando contava a trama de Roland de Gilead e seus companheiros em A Torre Negra conseguia cheirar a poeira e sentir o ranger do couro. É por isso que eu disse que Stephen King é um contador de histórias. Se você escreve e consegue fazer suas palavras saírem do papel, se consegue sentir o que seus personagens sentem, se suas mãos tremem, se sua respiração altera a cada passo, se você também cheira a poeira e sente o ranger do couro, então pode descansar em paz. Seu trabalho está mais que bem feito.

Alguém gostar ou não, é só efeito colateral.


Você diz a verdade, e eu digo obrigado.

domingo, 13 de janeiro de 2008

Vale a pena ler... Desventuras em série!

Desventuras em Série é a prova de que um livro infanto-juvenil pode ser genial. Sério. A série, composta de 13 livros e 170 capítulos, é uma verdadeira descoberta. E um daqueles livos que ninguém lê por puro preconceito. Não sabem o que estão perdendo...

*pode ler sem medo, esse post não contém spoilers*

A história dos completamente desventurados Violet, Klaus e Sunny Baudelaire começa na Praia de Sal, quando recebem a terrível notícia de que seus pais morreram num incêndio que destruiu a mansão da família. Começa então a peregrinação Baudelaire, que vão pulando de lar adotivo em lar adotivo ao mesmo tempo em que tentam escapar das garras do cruel conde Olaf, um ator suspeito que quer roubar a forturna das crianças. Okay, eu posso até ouvir vocês perguntando “mas que raio de história manjada! Que genialidade há numa coisa dessas?”. Oh, calma... O brilho de Desventuras em série está na narração de Lemony Snicket, que trabalhou numa composição altamente original palavra que aqui significa “realmente difícil de achar em outros livros infanto-juvenis”.

À medida que a história avança de Mau Começo (primeiro livro da história e consequentemente, o mais simples) o leitor começa a perceber que Lemony Snicket é um personagem, assim como os próprios Baudelaire. Declarando seu amor desmedido à misteriosa Beatrice, Lemony diz que tomou como missão contar a saga dos órfãos Baudelaire para que o grande público saiba o que realmente aconteceu com eles. Assim, uma outra história começa a se desenrolar ao mesmo tempo que a dos irmãos: a história de Lemony Snicket. Entre uma pausa e outra, o autor-narrador-personagem deixa pistas sobre o que lhe aconteceu, pedaços de uma outra história, que teve lugar muito antes da dos Baudelaire.

E Lemony Snicket não pára por aí. Num humor negro irônico e muitíssimo afiado ele faz reflexões sobre a natureza humana, sobre a linguagem literária e sobre quão os contos de fada são imbecis. rs Sem contar as pequenas referências que fazem um leitor mais maduro sorrir por dentro. Por exemplo, quando a pequena Sunny Baudelaire quer se referir a alguém que não parece homem nem mulher ela diz “Orlando!” e quando os órfãos vão parar num hospital, ficam sabendo de uma mulher internada que tinha um olhar vagando pela janela chamada Clarissa Dolloway. Existem referências a Edgar Allan Poe, T.S. Eliot, C.S.Lewis, um livro inteiro que salta o nome de Robert Frost e um de seus mais famosos poemas, “The road not taken”, e mais um punhado de outras coisas que colorem a história para os leitores mais velhos. (e que fazem os mais novos terem vontade de pesquisar)

As imagens construídas por Lemony durante a série também são inteligentíssimas (não vou comentar muito para não estragar a leitura de vocês), assim como seus pensamentos filosóficos. Exemplo: “O destino é como um restaurante. Garçons trazem o tempo todo coisas que você não pediu e que dificilmente irá gostar”. E posso dizer que o final da série, o volume 13, é um primor. Um dos fechamentos de série mais bonitos que já li, de uma sutileza impressionante.
Outro ponto a favor é a tradução, que preservou muito dignamente o estilo de Lemony Snicket e que deve ter batido muita cabeça a fim de manter o senso de humor dos livros e os trocadilhos.

Pois é, leia Desventuras em série. Entre no mundo dos Baudelaire, com suas organizações secretas, duelos de dentes contra espadas, de acontecimentos bizarros, de coisas impossíveis mas que se tornam possíveis. Não é porque é um livro fino destinado para crianças que é ruim e simples. Muito pelo contrário.




Desventuras em série ganhou filme em 2004. O filme é a síntese dos três primeiros livros e apesar de ter alguns problemas de adaptação como todos os filmes que nascem de livros, posso dizer que é muito bom. Ganhou um Oscar de melhor maquiagem, inclusive. E conta com a participação de nomes como Jim Carrey (na pele do vilão conde Olaf), Jude Law (como o narrador Lemony Snicket) e Merryl Strip (interpretando tia Josephine). A fotografia é belíssima assim como a trilha sonora.

Lemony Snicket prossegue em suas narrações desventuradas. No Brasil, foram lançados Lemony Snicket: autobiografia não-autorizada e As cartas de Beatrice. Todos eles envolvendo o mundo dos Baudelaire de alguma forma.

Para se ter uma noção interessante dos livros e do próprio Lemony, faça uma visita ao http://www.lemonysnicket.com/ (disponível em inglês).








terça-feira, 1 de janeiro de 2008

Um sentimento #3 (ou só uma idéia...)

2008!!!!!!!! *dancinha feliz*


The hateful things you think you want to say

Time will turn them into jokes
- 15 minutes - The Strokes


segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

Não tive filho nem fui pra Ipatinga

Faz quase um mês que falei essa frase aí em cima pra uma amiga. Eu falei isso como uma piada, é claro, de algumas coisas que aconteceram com as pessoas perto de mim esse ano e como em comparação com todas essas "emoções" o meu ano foi uma pasmaceira total. Agora que estou no último dia de 2007, e olho para trás, para tudo que se passou comigo digo que foi um ano doloroso. É, eu acho doloroso é uma boa definição.

Não foi um ano ruim. Não foi um ano terrível, digno dos pesadelos mais horríveis. Não enfrentei as irmãs irremediáveis da vida (a fome, a morte e a guerra), e em vários aspectos, minha vida melhorou sensivelmente. Mas foi um ano doloroso porque tive de olhar para dentro de mim. Tive que rever a mim mesma. E pela primeira vez na vida eu tive dúvida. Eu questionei meus planos e metas, pus em cheque o que eu queria, eu perdi a minha confiança inabalável nas minhas capacidades...

Agora eu não tenho dúvidas mais. 2007 foi o ano da purgação. Foi uma dor necessária. Como o guardião de limiar da Jornada do Herói. Engraçado que o guardião em questão era eu. *idéias pulando da cabeça*

Em 2008, eu vou fazer minhas coisas, e elas se dividem em três grandes blocos: 1) realização - o que envolve minha escrita, 2) confiança - o que envolve minha atitude perante a sociedade e 3) finalização - o que envolve tudo, na verdade. Tenho alguns projetos em mente e eles prometem. hahaahahaha Ah, eu to me sentindo mais leve...

Não tive filho e nem fui pra Ipatinga, mas pari uma nova esperança e dei uma volta pelos reinos interiores da mente... Foi uma viagem solitária e de cavalo manco, mas é assim que a história fica boa, não é?




Nada jamais se perde... nada que não se possa encontrar... Tio Steve nunca esteve tão certo.







terça-feira, 25 de dezembro de 2007

Eu acredito no Natal

É, eu acredito no Natal. Independente de ser data religiosa ou comercial. No Natal, as pessoas dão melhor de si: seja para comprar bons presentes, seja para preparar uma ceia gostosa, ir à igreja ou visitar familiares.

Eu acredito no Natal. Porque eu acredito em pessoas. Eu acredito que as pessoas podem ser boas, que o ser humano possui uma capacidade imensa de amar, mesmo que às vezes se esqueça disso.

Eu acredito no Natal. Porque o Natal é a marca do nascimento de algo bom e esse algo bom pode fazer parte de todo mundo.

Eu acredito no Natal.

Porque existe luz.
(Se você souber onde acender...)

Eu acredito no Natal.

E você?










quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Um outro pensamento (ou Finding my way)

Nossa, parece que mil anos se passaram desde a minha última postagem (lamento) nesse blog. E eu não percebi o quanto sentia falta disso aqui até agora. Eu preciso me expressar. Tem hora que o mundo parece sumir e eu preciso fazer alguma coisa, qualquer coisa pra conseguir respirar... É, eu preciso mesmo me expressar. É uma coisa que não se faz apenas por amor, mas por necessidade mesmo. Como uma grande tomada de fôlego antes do mergulho. E a palavra escrita funciona pra isso – seja ela num pedacinho de papel ou na forma de pixels num blog... Mas é que tanta coisa tem se passado na minha cabeça... ordenar as coisas tem ficado cada vez mais difícil...

Todas as pessoas no mundo passam por um período assim em suas vidas. É quando a cabeça fica com idéias demais. Você pára tudo e começa a tenta organizar, mas começa a perceber que algumas peças do quebra-cabeças estão sobrando. Aí é hora de jogar fora o que não serve, mas você não sabe o que não serve porque perdeu a tampa do jogo, o modelinho onde se olha a figura a ser montada... É uma sensação de perda por excesso; como - e vou usar uma imagem muito comum da literatura agora - descer uma escada à noite e esquecer o último degrau. Aquele instante de desespero em que o pé fica suspenso no ar, é essa a sensação. Como se preparar para comer 10 cubinhos de chocolate e descobrir que só tem oito, ou atravessar uma piscina a nado e perceber na metade do trajeto que não se tomou fôlego o suficiente... Você olha para o lado e não vê ninguém como você. Completamente outsider, fora do mundo, fora das coisas, fora de lugar. Todas as pessoas no mundo passam por isso - uma espécie de paranóia universal, ninguém é especial por se sentir essa, por mais que pense que seja -, algumas percebem. Outras não.

Quem não percebe esse sentimento sufocante de não saber para onde correr normalmente pensa que é só uma fase da vida, que vai passar. Daí essas pessoas saem com os amigos, tiram umas férias, uns dias na praia, escutam uma música triste. Mas eu não sou uma dessas pessoas. Feliz ou infelizmente (eu não sei) sou daquele tipo que percebe e sente a paranóia universal agindo, e não há saída com amigos, férias de lugar bem longe, praia e música triste existente suficiente no mundo que faça a sensação ir embora. É como estar na tomada de um filme onde o personagem é filmado em câmera lenta, num lugar desolado, com um olhar perdido nos caminhos além...

É muito fácil saber onde se quer chegar. É fácil escolher o alvo. A coisa complica nos meios. Como se chega lá, que caminho escolher. Às vezes você está num caminho e descobre que estava no caminho errado; ou você estava no caminho certo e alguém te disse que era o errado, então você voltou mas depois descobriu que o certo era aquele mesmo e agora não se lembra mais da entrada da primeira via; ou você simplesmente vai andando numa direção, de olhos vendados, porque tem medo demais de ver para onde está indo... A vida é andar num trecho escuro de floresta: você vê poucos passos à frente, morre de medo dos arbustos em volta e torce para que aquela direção seja a da clareira de sol.

Algumas pessoas pensam que sentar no chão e esperar é uma forma melhor. Mas uma vez uma amiga me mandou uma mensagem no celular (aquelas coisas inacreditáveis da vida) que dizia: "Mesmo se estiver no caminho certo, se sentar, será atropelada". Imagina então se você se sentar no caminho errado! É preciso ir em frente. E se não for por fé, então que seja por lógica. Outras pessoas ainda acham que vivem intensamente cada momento, quando na verdade estão morrendo instantaneamente a cada movimento. A diferença é tão tênue... e tão crucial! Às vezes é difícil perceber. Porque você não parou para pensar, não jogou as peças que sobraram fora...

Não é preciso ter uma coragem grifinória para mudar o mundo. Porque para mudar o mundo você precisa partir logo da parte mais difícil, que é você mesmo. Lutar contra si em busca do que é verdadeiro (eu gosto de acreditar que a verdade existe, e está aí em algum lugar além da nossa compreensão) é uma batalha que pouca gente gosta de lutar. É uma bandeira que ninguém quer carregar. Porque é muito pesada... A chance que você tem é agarrar aquele momento da sua vida onde as idéias se acumularam demais, onde se perdeu por excesso. Buscar essa solução, esse pontinho de luz quente, coisa que venho tentando fazer obcessivamente todas as manhãs, dói mais do que se pensa porque dói justamente onde não pode doer... O eu é uma chave que perdeu a fechadura...

Eu respiro fundo. Deixo a coisa fluir, deixar pra depois... mas não dá. Eu sou daquelas pessoas que tomou consciência desse sufocamento e não há nada mais perigoso no mundo que uma tomada de consciência. Muita gente diz que a ignorância é uma bênção. Pode até ser. Consciência traz responsabilidade... incomoda. Mas se for pra escolher, eu escolho a consciência. É fácil demais viver de olhos fechados, difícil mesmo é aprender a enxergar no escuro. Fugir é voltar todo o caminho escuro da floresta. Uma hora ou outra, você vai ter que encarar a trilha de novo. Então, não é melhor fazer tudo de uma vez? Tentar seguir em frente, mesmo que tropeçando e escolhendo uns caminhos errados de vez em quando, rumo a você mesmo?

O que se encontra quando você se encontra, eu não sei. A maioria das perguntas do mundo não têm resposta, porque quando se responde uma, mais outras tantas se abrem... Como entender todas as conexões, todas as possibilidades de vida que se pode ter? Todos os caminhos que podem ser trilhados? Quantas possibilidades se abriram quando você acordou de manhã; e você escolheu só uma, então para onde foram as outras e quais seriam elas? Por que você encontrou com determinadas pessoas ao longo da vida? Quem era aquele homem sentado ao seu lado no ônibus? Quem era aquela mulher que passou do outro lado da rua? Por que o caminho deles cruzaram com o seu? E se você tivesse dito olá e realizado uma possibilidade? Por que escolhemos um caminho e não o outro?

O sufocamento, essa angústia, essa reflexão desenfreada, esse... sentimento preso dentro de nós parece se desenrolar infinitamente e eu só queria poder catar tudo, colocar na bolsa e ir dormir! Mas não dá. Eu ainda não cheguei lá. Eu to parada no meio da encruzilhada e essa situação é que mortifica de verdade. O mundo parece tão complexo, tão complicado. E tudo isso que se avoluma no ser humano pelo menos uma vez na vida, essa paranóia universal que alguns percebem e outros não, é uma coisa tão simples, tão primária, que está aí desde que o mundo é mundo e se resume a duas considerações:

Quem sou eu
e o que estou fazendo aqui?